Imagine uma corrida que dura três semanas, atravessa montanhas, muitas vezes, nevadas, campos de lavanda, castelos medievais e cidades históricas, tudo isso com pessoas nas ruas e estradas acompanhando de pertinho. Agora adicione atletas que pedalam, em média, quatro horas por dia, enfrentam subidas quase impossíveis e ainda disputam cada segundo na reta final. Esse é o Tour de France, a prova de ciclismo de estrada mais prestigiada, tradicional e desafiadora do planeta, desde 1903.
    O Tour de France não é apenas uma corrida de bicicletas, é uma verdadeira odisseia esportiva, uma prova de pura resistência, estratégia e emoção. Em 2025, o evento chega à sua 112ª edição e segue com enorme prestígio.
    Mas afinal, como funciona essa prova tão complexa? O que significam as camisas coloridas que os atletas usam? E por que tanta gente acompanha com tanta paixão? A seguir, tudo isso e ainda algumas curiosidades que tornam o Tour de France um verdadeiro fenômeno.
Lucien Buysse (1892-1980) durante uma tempestade nos Pirineus etapa 10 do Tour de France de 1926 (Foto de Keystone/Hulton Archive/Getty Images)

Como funciona o Tour de France?

    A competição é dividida em 21 etapas, disputadas ao longo de três semanas. Cada etapa tem um perfil diferente: algumas são planas (favoráveis aos velocistas), outras montanhosas (nas quais brilham os escaladores), e há ainda os temidos contrarrelógios individuais, em que cada ciclista corre sozinho contra o tempo.
    Os tempos de cada etapa são somados, e o ciclista com o menor tempo acumulado veste a lendária camisa amarela, símbolo máximo do líder da classificação geral.
    Para largar na etapa seguinte é preciso terminar a etapa anterior dentro de um tempo mínimo estabelecido pela organização e baseado na velocidade média de cada etapa. Se ficar de fora desse tempo mínimo, ou ainda desistir da etapa por causa de uma queda ou problema na bicicleta, o atleta está eliminado e não larga na etapa seguinte.

As camisas e seus significados no Tour de France

Essas camisas são disputadas diariamente, em cada uma das 21 etapas, o que cria várias “corridas dentro da corrida” e mantém o Tour de France emocionante do início ao fim.
    O Tour é também um desfile de cores com significados bem definidos. Cada uma delas também rende premiações em dinheiro por etapa. E mais do que isso, elas transformam a disputa em uma corrida com múltiplas narrativas; enquanto um ciclista luta pelo tempo, outro briga por pontos, e um terceiro escala montanhas.

Camisa Amarela (Maillot Jaune):

    usada pelo líder da classificação geral, que é o ciclista com o menor tempo acumulado na classificação geral. É o símbolo máximo do Tour de France e coroa o melhor ciclista, que consegue se destacar nas montanhas, segue na parte da frente nas chegadas planas e não perde tempo nos contrarrelógios.
    Criada em 1919, a cor amarela da camisa foi escolhida em homenagem ao jornal L’Auto, organizador da prova, que era impresso em papel amarelo. A primeira camisa amarela foi vestida por Eugène Christophe, antes da 11ª etapa do Tour de 1919, às 2h da manhã, após uma pausa de quatro anos por causa da Primeira Guerra Mundial.

Camisa Verde:

    premia o melhor sprinter, ou seja, o melhor velocista, o ciclista mais regular nas chegadas e sprints intermediários, somando o maior número de pontos possíveis, sem se preocupar com o tempo acumulado. 
    A camisa para o rei da velocidade foi criada em 1953, no 50º aniversário do Tour. A cor verde foi escolhida porque o patrocinador da classificação por pontos era uma empresa de jardinagem.
    A disputa pela camisa verde é uma das mais acirradas, pois envolve pontos em quase todas as etapas, mesmo nas montanhosas e pode ser definida apenas na última etapa.

Camisa de Bolinhas (branca com bolinhas vermelhas):

     vai para o rei da montanha, o melhor escalador da prova. Foi criada em 1975, embora a classificação de montanha exista desde 1933. A escolha da cor e das bolinhas foi do patrocinador da época.
    As montanhas são classificadas por dificuldade (de 4 a 1, além da “Hors Catégorie”, ou “fora de categoria”), e quanto mais difícil a subida, mais pontos ela vale.

Camisa Branca:

    destinada ao melhor ciclista jovem (menos de 26 anos) na classificação geral. Foi criada em 1975 para simbolizar juventude e pureza, sem ligação com patrocinadores.
    Muitos campeões do futuro começaram brilhando com a camisa branca, e é um ótimo termômetro para descobrir a próxima estrela do ciclismo.

Outras premiações do Tour de France

    Existem duas outras classificações que não possuem uma camisa especial. A primeira é o Prêmio de Combatividade e a segunda é Classificação por Equipes.
    Após cada etapa, sem contar a disputa de contrarrelógio, um comitê decide qual foi o ciclista mais agressivo do dia, que tenha atacado de forma consistente, provocado uma fuga ou que tenha sido um ciclista importante no resultado da etapa. Não necessariamente, o vencedor da etapa é o mais agressivo do dia.
    Para diferenciar, o ciclista mais agressivo usa um número de corrida vermelho (em vez de preto) na etapa do dia seguinte. Um Prêmio de Super Combatividade é concedido na etapa final do Tour de France.
    A Classificação por Equipes é baseada no tempo coletivo dos três ciclistas mais bem colocados na classificação geral de cada equipe. A melhor equipe usa seus números de corrida contra um fundo amarelo e também pode usar capacetes amarelos.

Curiosidades do Tour de France

  • A origem foi jornalística. O Tour foi criado em 1903 pelo jornal francês L’Auto (antecessor do L’Équipe) para aumentar as vendas. A ideia deu tão certo que o jornal virou referência no ciclismo e a prova uma das mais importantes.
  • A primeira edição teve apenas 6 etapas, mas cada uma com mais de 400 km. Os ciclistas pedalavam de madrugada e dormiam em hotéis simples ou até ao relento.
  • A etapa mais longa da história teve 482 km e foi realizada em 1919, entre Les Sables-d’Olonne e Bayonne. Hoje, as etapas raramente passam de 220 km.
  • O Tour já foi interrompido por guerras. A prova não foi realizada durante a Primeira (1915–1918) e a Segunda Guerra Mundial (1940–1946).
  • O público é parte do espetáculo. Estima-se que mais de 10 milhões de pessoas assistam ao Tour ao vivo nas estradas todos os anos, sendo que muitas acampam dias antes para garantir um bom lugar.
  • Ciclistas queimam até 6.000 calorias por dia. Eles consomem uma média de 8 a 10 mil calorias diárias para manter o rendimento, com muito arroz, massas, barras energéticas e até refrigerantes, principalmente após as provas.
  • As bicicletas são super tecnológicas. Pesam cerca de 6,8 kg (o mínimo permitido pela UCI) e podem custar mais de R$120 mil cada, com materiais como fibra de carbono e sensores de potência.
  • O Tour já teve largadas fora da França. Bélgica, Países Baixos, Reino Unido, Alemanha, Dinamarca e até Mônaco já sediaram o início da prova.
  • O recorde de vitórias é de cinco títulos. Compartilhado por Jacques Anquetil, Eddy Merckx, Bernard Hinault e Miguel Indurain.
  • O “lanterne rouge” também é famoso. O último colocado da classificação geral recebe esse apelido (vermelho como o farol traseiro de um trem) e, curiosamente, costuma ganhar muita atenção do público.
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